quarta-feira, 29 de julho de 2009

Insisto em um não Anti-Percurso

Ontem eu estava relendo um texto de Greiner e encontrei algumas colocações que, mais do que reforçar, fizeram-me ampliar as idéias contidas no texto que escrevi anteriormente.
Por mais voltas que minha escrita tenha dado, sentia-me desatada a velhas restrições, umas criadas por mim e outras assimiladas, refletindo pensamentos alheios...
Greiner em Cinco questões para pensar na dança contemporânea brasileira como anticorpos à categoria de “corpo brasileiro” (2007) levanta um questionamento acerca da pesquisa em dança contemporânea no Brasil, uma categoria influenciada por estrangeirismos que por vezes, perde-se ao procurar artifícios para ser mundialmente aceita, como se cada corpo não carregasse em si uma série de experiências definindo seus estados de movimento, de estar-se em relação ao outro, a si, ao mundo...
Quando eu sugiro nesse processo de montagem que não nos prendamos, por enquanto, àquilo que sem re-visitar acreditamos já não nos pertencer, percebo as idéias de “Desvio” brotando mais facilmente e, se quisermos tantas outras virão, normal sermos mais instigados pelo novo, criar cenas e movimentos “diferentes” dos nossos. Mas a idéia de identidade, pra mim é fundamental. Quando pesquisei para o TCC a trajetória da cena de algumas companhias de dança percebi que por mais que houvesse em boa parte dos coreógrafos uma necessidade do novo, padrões estéticos sempre se repetiam. O que mais chamou a minha atenção foram os coreógrafos que mais do que perceber isso como um efeito, assumiram essa identidade como causa.
Ter que por própria conta apontar características de cena inerentes ao trabalho das Cias. sem a ajuda de alguns criadores (por dificuldade de auto-analisarem-se) foi no mínimo surpreendente! Não por nada é que os espetáculos mais consistentes que formavam uma identidade forte são, a meu ver, daqueles criadores conscientes da construção de uma identidade para o seu trabalho.
Pode parecer meio ambíguo falar de construção de identidade ao mesmo tempo em que proponho que não “nos prendamos”. Não sugiro que devamos “dar voltas em torno da cola” heheh e muito menos que partamos para uma busca desenfreada em torno do maisssss contemporâneo em dança.
Sugiro somente que não tenhamos problemas em re-visitar nosso passado corporal e estético, entendamos o que ainda nos cabe e que isso, obviamente seja repensado em virtude de nossas inquietações atuais.... Uma idéia, por sinal, bem antiga. Faz-me lembrar dos antropofágicos da semana de 22 heheh!
Devemos cuidar com os anticorpos apontados por Greiner! Não precisamos ampliar tanto a idéia assim, saiamos dos anticorpos que criamos à nossa brasilidade e passamos para a nossa octanidade heheh! Assim como Greiner (2007, p.14) não se refere “a um pacote de regras dadas e coerentes com a imagem do que se convencionou chamar de dança brasileira ou corpo brasileiro...” não estou visando um remake de “2”, “Vácuo”, “Frágil”.... Mas eu acho que isso já está claro, ou não?
Acho que sim hehheh!
Creio que essa questão não se limita a apenas criação de vocabulário de movimento, ela pode ser ampliada aos vários elementos que compõem a cena e nesse ponto, lembro a interação com a tecnologia.
Em nosso site está escrito:
A companhia atualmente desenvolve pesquisa acerca da relação entre arte e tecnologia, entendendo essa relação como fator primordial para a construção de um novo olhar sobre o corpo.
Assim que li me perguntei se essa afirmativa é totalmente verdadeira, se talvez ela não seja a nossa intenção, mas não ainda a prática. Essa é uma dúvida que eu tenho, sei que à parte, algumas integrantes têm uma relação entre dança e tecnologia mais próxima (vídeo-dança é um bom exemplo disso). Mas quanto aos espetáculos da O’ctus? Quanto, realmente, está estabelecido essa relação? Às vezes percebo uma dissociação no momento de criação! A tecnologia entra depois da criação, parece que ela é muito mais solicitada após a concepção de uma idéia de cena, por exemplo.
Claro que as associações nem sempre são instantâneas e que em meio a tantas mudanças a relação entre dança e tecnologia também pode ter sido distanciada, assim como tantas outras relações que estamos aproximando. Mas enquanto não colocarmos essa questão “na roda” vai continuar aquela frase em nosso site, e eu estarei sem saber se realmente faz parte de nossa realidade ou de nossas intenções! E aqui me refiro aos espetáculos de dança, o quanto a tecnologia esteve presente como fator primordial à criação cênica? E, qual ou quais tecnologias estão sendo discutidas?
Questões a serem pensadas, nem eu que escrevi sobre, sei exatamente se concordo com tudo escrito referente à tecnologia...
Greiner ainda aponta outra questão que mais uma vez me remete às nossas memórias corporais e a uma parte de nossa identidade O’ctus:

O processo de imitação carrega, pela sua própria natureza, a impossiblidade da fidelidade da cópia. O risco é o esvaziamento da fidelidade do processo, a despolitização da ação. Algo que no Brasil, como que em outros países, já aconteceu inúmeras vezes ao se tomar um modelo cultural estrangeiro como decalque e não como mapa. Isso porque, ao usar a informação estrangeira como ignição criativa, instala-se um novo processo e a vitalidade se restaura. Mas ao colar no outro, o decalque anuncia a experiência defunta típica dos movimentos massificadores, quando a memória pessoal desaparece para ceder lugar à memória coletiva. (GREINER, 2007, p. 16)

A citação me parece um válido conselho. Penso que é muito fácil nos encantarmos com as novas possibilidades da dança contemporânea, principalmente ao assistirmos espetáculos de Bausch, Keersmaeker, Perdeneiras... No entanto, mais encantador do que um espetáculo de algum desses criadores, penso ser a identidade que cada um criou para seu trabalho, presente em cada movimento, gesto, ação, figurino, luz, cenário...
Charlene

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